Desabamento em Fortaleza ensina que síndicos não devem descuidar da manutenção
Foi uma comoção nacional. No dia 15 de outubro, o edifício Andrea, em Fortaleza, desabou, matando nove pessoas – entre elas moradores, funcionários e a síndica – e deixando sete feridos.
O laudo sobre o motivo que levou o prédio a cair ainda não foi divulgado, mas o que ficou claro é que a edificação tinha problemas com as suas colunas de sustentação – e que havia negligenciado, durante muito tempo, a manutenção corretiva e preventiva das suas áreas comuns.
Justamente por isso, uma empresa de engenharia havia sido chamada ao local para efetuar reparos. Infelizmente, algo aconteceu e o prédio desabou com moradores e trabalhadores ali.
“É importante salientar que o cuidado com as áreas comuns é uma das maiores responsabilidades do síndico”, analisa Gabriel Karpat, diretor da administradora GK.
O conceito tem amparo legal. O artigo 1.348, parágrafo V, do Código Civil, é claro quanto às competências do síndico:
V – diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores;
“Por isso estar de olho na manutenção, e acompanhar sempre de perto é fundamental. O síndico não pode deixar isso de lado”, analisa Gabriel Karpat.
O síndico não precisa saber de tudo
Muitas vezes, ao ser eleito pela primeira vez, o síndico não tem ideia do aprofundamento necessário em diversos temas que são pertinentes ao seu cargo.
Exigir que o síndico tenha grandes conhecimentos em direito, contabilidade, gestão de pessoas, administração de empresas, engenharia não condiz com a realidade.É por isso que o gestor deve se cercar de empresas que entendam dos assuntos que ele não domine.
A administradora do condomínio deve ser essa parceira do síndico, indicando empresas de engenharia capazes de efetuar as melhorias nas áreas comuns que sejam necessárias.
Para fazer um bom trabalho, a administradora deve se focar em dois pontos: calendário de manutenção preventiva em dia e reparo rápido das manutenções emergenciais.
“Poder contar com uma empresa séria, que irá fazer um trabalho correto de manutenção, é fundamental para o síndico e para os moradores”, assinala Gabriel.
Calendário de manutenção do condomínio
“É importante dizer que muitas vezes falta anamnese para o condomínio de uma forma geral”, analisa Israel Alves, diretor da Nivel A Reformas, empresa especializada nos cuidados com condomínios.
Para que isso não aconteça no seu condomínio, vale procurar uma empresa que analise todo o condomínio.
“O especialista entrega ao condomínio um laudo já com um diagnóstico do que deve ser feito para preservar aquela edificação. Não é um valor proibitivo e realmente impacta na tomada de decisões”, argumenta Israel.
Com um plano em mãos, fica mais simples de englobar esses valores na previsão orçamentária do próximo período, diluindo os custos e evitando que uma grande quantia precise ser gasta de uma só vez.
Um bom calendário de manutenção deve incluir todos os equipamentos do condomínio, do pára-raios ao portão. Deve-se saber a periodicidade de visita da empresa responsável pelos seus cuidados e que tipo de inspeção deve ser feita no equipamento.
O zelador, ou gerente predial, deve acompanhar essa visita e conhecer o calendário de manutenção, de forma a se certificar de que as visitas estão sendo executadas como o esperado.
Problemas mais comuns de manutenção condominial
Muitos condomínios não seguem o seu calendário de manutenção como deveriam, e o resultado mais comum dessa conduta são problemas que se agravam com o tempo.
O mais recorrente são as infiltrações. “Começa com uma parede que fica molhada, um teto que começa a pingar. Se isso não for corrigido na raiz, estruturas metálicas podem ficar comprometidas, e algo que custaria x pode custar quatro vezes mais” calcula Levi Gracindo, diretor comercial da empresa FM reformas, também especializada em condomínios.
Impermeabilizações que não são acompanhadas com o passar dos anos também podem ser a raiz de um problema que se espalha e fica mais custoso.
“É importante dizer que nada dura para sempre. Assim como a pintura ou lavagem de fachada deve ser feita periodicamente, uma impermeabilização deve ser refeita a cada 15 ou 20 anos. É bastante tempo e o condomínio deve ser cotizar para fazer frente a esse custo”, argumenta Levi.
Dinheiro X manutenção
Um ponto levantado por todos os especialistas ouvidos para essa matéria é que a maior dificuldade enfrentada pelo síndico para realizar uma grande manutenção são os custos envolvidos.
“Ninguém quer pagar uma taxa extra, por exemplo. Fica difícil manter uma boa manutenção se os moradores não estão interessados em pagar por ela”, alerta Levi.
Mas como agir quando o prédio realmente precisa de uma reforma e a mesma não é aprovada em assembleia?
“Se sou eu o síndico de um condomínio que está precisando de uma obra e a assembleia não aprova esse gasto, eu renuncio”, afirma o advogado especialista em condomínios Marcio Spimpolo.
Isso porque por mais que a decisão de não gastar seja da assembleia, o síndico pode ser implicado futuramente caso haja algum problema legal decorrente da falta de manutenção.
“Por isso falamos tanto sobre manutenção preventiva e calendário de manutenção. É uma forma de economizar no longo prazo”, analisa Gabriel Karpat.
OUTROS CASOS DE DESABAMENTO
Esse, infelizmente não foi o primeiro caso de desabamento no Brasil.
Em 2018, em São Paulo, o edifício Wilton Paes de Barros, no centro da cidade, desabou em decorrência de um incêndio, que atingiu mais dois prédios vizinhos. O local era ocupado de forma irregular desde 2003. Os resultados são números que entristecem: sete mortos e dois corpos desaparecidos.
Em 2011, no Rio de Janeiro, três prédios do centro da capital carioca desabaram em decorrência de uma explosão em um restaurante, o Filé Carioca. O que foi considerado um desastre na época, deixou 4 mortos e 17 feridos sem haver, até hoje, uma decisão na Justiça.
Há quem diga, até que a NBR 16.280/2015 foi uma resposta do Poder Público a esse tipo de situação.
A partir da aprovação da norma, qualquer alteração estrutural executada em uma edificação deveria ser acompanhada de uma ART (Anotação de Responsabilidade Técnica) ou RRT ( Registro de Responsabilidade Técnica), de forma a resguardar a segurança de quem mora e trabalha no local – além de preservar a vida útil da edificação.
Existem outros casos, é claro, de desabamento em menor escala, mas esses dois edifícios realmente tiveram um lugar de destaque, até em termos de cobertura midiática.