Assembleias virtuais serão herança da pandemia?
O ano de 2020 com certeza guardará um significado histórico para o século XXI. Afinal, foi um período totalmente atípico e que apresentou mudanças que devem perdurar em diversos aspectos da nossa vida em sociedade. Com a vida em condomínio, com certeza, não será diferente.
E, com grandes mudanças na vida prática, as alterações no Direito também vão acontecendo, de forma a acompanhar o que acontece no nosso dia a dia.
Um dos grandes exemplos de como o Direito deve acompanhar a vida prática é justamente a questão das assembleias condominiais neste momento de pós pandemia.
A grande novidade sobre o tema foi a lei 14.010/2020, que permitiu, até 30/10, a realização das assembleias virtuais ou remotas, devido à pandemia.
Antes disso, já havia alguns casos em condomínios que usavam desse tipo de ferramenta, por analogia à lei que permite que associações decidam por meio de assembleias remotas os caminhos a serem tomados para si.
Mas e os condomínios? Com o término da vigência da lei vão continuar fazendo assembleias virtuais? Agora, com os casos de covid-19 aumentando em diversas cidades brasileiras, devemos voltar a fazer assembleias presenciais?
As perguntas são difíceis de se responder, e há muitas respostas que só o tempo deve trazer. Também deve-se deixar claro que nem todos os condomínios contam com a possibilidade de fazer uma assembleia virtual. Neste caso, a principal causa para tanto seria a convenção condominial vedar expressamente esse tipo de encontro.
“Temos condomínios que realmente proíbem esse tipo de assembleia. Nesse caso, o fundamental é primeiro alterar a convenção”, assinala Gabriel Karpat, diretor da administradora GK.
Esse seria o principal problema, hoje, para quem busca seguir com o modelo das assembleias virtuais nos seus condomínios.
Nem tudo é perfeito
Se as assembleias virtuais são realmente a herança da pandemia para o mercado condominial, é importante saber como escolher bem um modelo para a sua comunidade.
Há muitas vantagens no modelo virtual: pode-se contar com um quórum maior, há menos debates acalorados, o tempo pode ser melhor regulado e toda a assembleia fica gravada e guardada, de forma a dirimir qualquer tipo de dúvida no futuro.
Mas nem tudo são só elogios.
“Percebi que muitas vezes podemos ter problemas, sim, com as assembleias do tipo – que podem apresentar dificuldades das mais diversas, como de conexão, ou o condômino conseguir participar da discussão, mas não conseguir votar pelo sistema”, exemplifica o síndico profissional Nilton Savieto.
Ele conta também que muitos condomínios não gostaram da experiência e que só devem recorrer às assembleias virtuais caso haja necessidade real, como vencimento do mandato do síndico ou para aprovação de contas do período.
Há também a questão financeira, já que nem todas as administradoras ofertam esse serviço sem custos adicionais – o que pode pesar no bolso do condôminos.
“É importante assinalar que nem tudo serve para todos os condomínios. Há aqueles que se adaptaram bem a esse formato, e outros em que a novidade não foi muito bem recebida, principalmente aqueles com mais idosos”, explica.
Savieto, porém, já voltou a fazer as assembleias presenciais. “É fundamental que o condomínio esteja com a sua parte legal em dia”, pesa ele.
Mas estar com as obrigações legais em dia pode se tornar mais difícil presencialmente, em que pese que o número de casos de covid está crescendo novamente.
“Aqui em Curitiba, por exemplo, podemos fazer assembleias presenciais, mas deve-se respeitar o número de pessoas por metro quadrado máximo, o que pode inviabilizar o encontro para diversos condomínios com maior número de condôminos e que tenham um espaço menor para promover a assembleia”, pontua Luciana Lozich, advogada especializada em condomínios.
Há também casos de condomínios que tiveram suas assembleias presenciais impugnadas no ápice da pandemia, como aconteceu em São Paulo.
O condomínio em questão promoveu um encontro do tipo presencial e teve baixíssimo quórum, uma vez que os moradores não quiseram se expor à presença dos outros condôminos – justamente devido à pandemia.
Mas, com o fim da vigência da lei, muitos condomínios se viram na obrigação de voltar a celebrar as assembleias presenciais.
“Eu acredito que as assembleias virtuais realmente vieram para ficar. Não é proveitoso acharmos que vamos retroceder no tempo”, analisa Gabriel Karpat.
O temor de alguns síndicos é que apenas um condômino insatisfeito procure impugnar o que foi decido na assembleia online.
“É fundamental seguir todas as exigências da convenção, da mesma forma como se fosse uma assembleia presencial. Edital de convocação com o prazo certo, lista de presença, uma ótima plataforma em que seja possível debater e votar, e uma ata bem redigida dentro do prazo com certeza vão dar mais segurança a todos. E, infelizmente, é verdade: sempre pode haver um condômino insatisfeito querendo impugnar a assembleia, mas isso já ocorria antes do encontro virtual”, frisa Karpat.
Modelo híbrido
Uma alternativa atual é o chamado “modelo híbrido”, em que há a possibilidade de se fazer a assembleia presencial e virtual.
“É uma forma de agregar aqueles que não gostaram da virtual”, explica Lozich. Nesse caso, a assembleia acontece ao mesmo tempo no ambiente virtual e, aqueles que preferirem podem participar do encontro de qualquer local.
Pode ser mais uma maneira de integrar, da melhor forma possível, os condôminos.
“Um dos principais pontos hoje é a participação dos condôminos. Acredito que se as assembleias virtuais trouxerem isso, como já pudemos ver em muitos casos, não vejo motivo para não acontecerem”, assinala Karpat.